Saudações caros companheiros, como estão? Apenas relembrando... Antes de ontem eu havia postado um artigo sobre esse livro, e agora o terminei de ler. Está duplamente recomendado a todos os que se interessarem.
Comentário de Joseli Ernesto Cescham (O Globo): “Quase perfeito: substitindo “linguagem novelesca” por “linguagem jornalistica”m seu dpoimento torna-se irretocável. Como um repórter, percorre todo o continente, do descobrimento aos nossos dias (ou noites), do extermínio das antigas civilizações indígenas à atual desolação de nossas maiorias”
Fragmentos do livro:
“A metade das crianças cubanas não iam à escola em 1958; haviam mais prostitutas registradas do que operários mineiros.”
“A quantas Hiroximas equivalem seus extermínios sucessivos?”
“Che Guevara dizia que o subdesenvolvimento é um anão de cabeça enorme e barriga inchada: suas pernas débeis e seus braços curtos não se harmonizam com o resto do corpo.”
“Um inglês podia viver, no século XVIII, com seis libras por ano; os mercadores de escravos de Liverpool somavam lucros anuais de mais de 1.100 mil libras, contando exclusivamente o dinheiro obtido no Caribe e sem agregar os benefícios do comercio adicional.”
“O capital acumulado no comércio triangular (manufaturas, escravos, açúcar) tornou possível a invenção a máquina a vapor. Com capitais obtidas deste tráfico de escravos, os irmãos Bown, instalaram o forno de fundição que produziu os canhões de Gorge Washington na guerra da independência”
“Assim, ia-se esvaindo o sangue por todos estes processos. Desenvolviam-se os países desenvolvidos de nossos dias; subdesenvolviam-se os subdesenvolvidos”
O livro possui um posfácio (a 26ª edição) editado pelo próprio autor em abril de 1978 com vinte itens. Vou transferir pra cá os que eu achei mais importantes.
1 Passaram-se sete anos desde a primeira publicação de As Veias Abertas Da América Latina (hoje mais).
Este livro havia sido escrito para conversar com o pessoal. Um autor não especializado dirigia-se a um público não especializado, com a intenção de divulgar certos fatos que a história oficial, história contada pelos vencedores esconde ou mente.
A resposta mais estimulante não veio das páginas de algum suplemento literário de jornal, sena que de alguns episódios reais ocorridos na rua, Por exemplo: a moça que ia lendo o livro para sua companheira de assento e terminou pondo-se de pé e lendo em voz alta para todos os passageiros enquanto o ônibus atravessava as ruas de Bogotá; ou a mulher que fugiu de Santiago do Chile, nos dias da matança, com o livro envolto nas fraldas do bebê; ou ainda o estudante que durante uma semana percorreu as livrarias da rua Corrientes de Buenos Aires e foi lendo pedacinho em pedacinho, de livraria em livraria, porque não tinha dinheiro para comprá-lo.
Paralelamente, o comentário mais favorável que o livro recebeu, não provém de nenhum critico literário de prestígio, mas das ditaduras militares que o elogiaram proibindo-o. No meu país (Uruguai) por exemplo, não pode circular, assim como no Chile e na Argentina. As autoridades o denunciaram, na televisão e nos jornais, como um instrumento de corrupção da juventude. “Não deixam ver o que escrevo”, dizia Blas de Otero, “porque escrevo o que vejo”.
Creio não haver presunção na alegria de comprovas que, com o passar do tempo, As Veias não tenha se tornado um livro mudo.
2 Sei que pode ter parecido um tanto sacrilégio que este manual de divulgação fale de economia política no estilo de um romance de amor ou de piratas. Mas provoca-me engulhos, confesso; ler alguns trabalhos valiosos de certos sociólogos, politicólogos, economistas ou historiadores que escrevem em código. A linguagem hermética nem sempre é o preço inevitável da profundidade. Em alguns casos pode estar simplesmente escondendo uma incapacidade de comunicação, elevando-a à categoria de virtude intelectual. Suspeito que o fastio serve, dessa forma, para bendizer a ordem estabelecida: confirma que o conhecimento é um privilégio da elite.
Algo parecido costuma ocorrer, diga-se de passagem, com certa literatura militante dirigida a um publico conivente. Parece-me conformista, apesar de toda a sua possível retórica revolucionaria; uma linguagem que repete mecanicamente, para os mesmos ouvidos, as mesmas frases pré-fabricadas, os mesmos adjetivos, as mesmas fórmulas declamatórias. Talvz essa literatura de paróquia esteja tão longe da revolução como a pornografia está longe do romantismo.
3 Alguém escreve para tratar de responder às perguntas que lhe zumbem na cabeça – moscas tenazes que perturbam o sono; e o que alguém escreve pode adquirir sentido coletivo quando, de alguma maneira coincide com a necessidade social resposta. Escrevi As Veias Abertas para difundir idéias alheias e experiências próprias que talvez ajudem um pouquinho, com sua medida realista, a resolver questões que nos perseguem desde sempre: A América
Latina é uma região do mundo condenada à humilhação e à pobreza? Condenada por quem? Culpa de Deus? Culpa da natureza? Do clima modorrento? Das raças inferiores? A religião e os costumes? Não será a desgraça um produto da história, feita por homens, e que, portanto, pelos homens pode ser desfeita?
Latina é uma região do mundo condenada à humilhação e à pobreza? Condenada por quem? Culpa de Deus? Culpa da natureza? Do clima modorrento? Das raças inferiores? A religião e os costumes? Não será a desgraça um produto da história, feita por homens, e que, portanto, pelos homens pode ser desfeita?
A veneração do passado sempre me pareceu reacionária. A direita escolhe o passado porque prefere os mortos: mundo quieto, tempo quieto. Os poderosos, que legitimam seus privilégios pela herança, cultivam a nostalgia. Estuda-se história como se visita um museu; e esta coleção de múmias é uma fraude. Mentem-nos o passado como nos mentem o presente: mascaram a realidade. Obriga-se o oprimido a fazer sua, uma memória fabricada pelo opressor: estranha, dissecada, estéril assim, ele resignará a viver uma vida que não é sua, como se fosse a única possível.
O passado sempre aparece convocado pelo presente, como memória viva do nosso tempo. Este livro é uma busca de chaves da história passada, que contribuiu para explicar o tempo presente, (que também faz história), a partir da base que a primeira condição para modificar a realidade consiste em conhecê-la. Não é oferecido, no caso, um catálogo de heróis vestidos para um baile à fantasia, que ao morrer em batalha, pronunciam longos passos de multidão que porventura apresente nosso recente caminhar. As Veias Abertas provém da realidade, mas também de outros livros, melhores que este, que nos tem ajudado a conhecer o que somos, para saber o que podemos ser, e que nos têm permitido averiguar de onde viemos para melhor adivinhar aonde vamos. Esta realidade e estes livros mostram que o subdesenvolvimento latino-americano é uma conseqüência do desenvolvimento alheio, que nós, latino-americanos, somos pobres porque é rico o solo que pisamos e que os lugares privilegiados pela natureza têm sido malditos pela historia. Nesse nosso mundo, mundo de centros poderosos e subúrbios submetidos, não há riqueza que não seja, no mínimo, suspeita.
Não existe comentário possível para reporta a minha admiração ao livro, espero que se interessem por ele. Abraço!
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